domingo, 16 de janeiro de 2011

A ARTE da SOLIDARIEDADE (ou: UM SUSTO BOM...)

- sobre a tragédia no Rio: um momento muito... MUITO ESPECIAL! –
por Nuno Arcanjo*



(antes, algo importante: não vemos nada com os olhos, mas com o pensamento!
Olhando as imagens dessa tragédia, por exemplo, podemos “ver” muitas coisas: o desespero das vítimas; a destruição dos lugares; o descaso das autoridades que não investiram em obras de prevenção; a fúria misteriosa da Natureza; a impressionante mobilização solidária por todo país... enfim, são muitas as “visões”. Aquela em que nos ligamos
(acreditando mais, pensando, falando e agindo) se transforma em NOSSA REALIDADE!
É assim que funciona!!!
Nesse texto, quero escreVER... no meio de tantas, uma realidade muito,MUITO ESPECIAL!)

Obs.: se estiver ‘sem tempo’, e for uma pessoa “objetiva”
 pule esta primeira parte,vá direto lá pra baixo, onde diz:
Mas, bom humor à parte, vamos a uma reflexão mais “séria”!” (rsss...


Hoje, Domingo, após meu café da manhã, peguei minha bicicleta fui até Cruz Vermelha de Belo Horizonte. Chegando perto, ainda antes da entrada, levei um susto: Muita, MUITA GENTE! Na rua da frente uma fila interminável de carros e mais carros que não paravam de chegar com doações. E as pessoas na porta recebendo e amontoando os sacos e caixas que já não cabiam lá dentro. Tiveram que improvisar um toldo, uma grande “varanda” na calçada para colocar o que chegava. Logo na entrada esse susto foi me tomando em alegria e comecei a sorrir “Caramba, que coisa!!!”. Aí fui entrando pra entregar meu humilde colchonete de ginástica, mais umas 3 peças de roupa, e uma moça, com um sorrisão, me falou,: “Opa, obrigada, é aqui mesmo!”. “Ah, e para cadastrar para voluntário?”, “Você segue pelo corredor, é lá no fundo!”. Ao passar pelo tal corredor, quase que não via as paredes, era só cesta básica, e sacos e mais sacos de doação. Chegando lá na sala do cadastro, encontrei várias pessoas, diferentes, se cadastrando. Velhos e crianças. Uma delas, a Isabela, de 9 anos (animadíssima, nossa mascote lá!) Aí preenchi uma ficha com todos os meus dados (super organizada a história), entreguei para uma moça atrás de uma mesa, peguei meu colete de voluntário e fui... opa, antes de sair a moça da mesa disse: “Olha, tem café, biscoito e água ali ó!” ; “Ah, obrigado, vou aceitar água”; “Ixi, parece que água acabou... ah, péraí, toma a minha garrafa aqui!”; “Opa, valeu...”. E então, bem hidratado (e muito bem tratado), lá fui eu. Fui para a entrada procurar saber onde precisavam de mais ajuda. Aí, meio no susto veio uma moça e me entregou três sacos ENORMES: “Epa, isso é o quê”, “São brinquedos!”; “Olha! E onde eu coloco?!”; “Ih, não sei, descobre!”. E lá fui eu, inaugurar meu voluntariado com um sacão de brinquedos. Entrei pelo tal corredor de cestas básicas (nessa hora cheio de gente também) e aí não resisti: “Dá licença, olha o Papai Noel, olha o Papai Noel...” quem ouviu, sorriu, e eu... me diverti. Bom, descobri que não tinha lugar de “brinquedos”. Ainda! Minha missão então foi inaugurá-lo! Busquei caneta e papel e fiz a plaquinha pra parede: “Brinquedos”. Fiquei ali por um tempo (achei bem curioso o pessoal doar brinquedos no meio duma tragédia! Aí me veio uma luz: tem muita criança desabrigada, é essencial para a dieta delas.). Fiquei por ali na sessão dos brinquedos, como não chegaram mais, mudei para a de macarrão, que era bem ao lado. E conheci, assim de nome, minha primeira colega de trabalho, a Sueli. Ela disse: “pois é, ontem eu tava de cama, passando mal, vomintando, mas hoje acordei e vim... comecei a trabalhar e melhorei na hora!”. Fiquei por ali um tempo ajudando a Sueli no macarrão e nos miojos (nossa, quanto Miojo!). Aí, ficou tranqüilo por lá e resolvi mudar de sessão. Na hora que estava saindo, chegou mais uns brinquedos, disse logo: “Opa, é aqui, pode deixar comigo”. Aí, uma cena especial, apareceu um navio, de brinquedo. Uma réplica do “Bejamim Guimarães”, uma embarcação antiga que, até hoje, navega o rio São Francisco, ali na região da cidade de Pirapora, norte de Minas (e lá, é a cidade da minha vó materna... o brinquedo lembrou a minha infância). Achei forte aquilo, um barco, e grande, no meio da enxurrada... de doações. (veja a foto do início. E outras ao fim do texto).
Despedi do “Benjamin” e segui. Fui parar no andar de cima, na sessão de roupa de cama. Chegando lá, mais três amigos: Juliane Lençol, Rodrigo Edredon e Léo Travesseiro (sugeri esse sobrenome pra ajudar na separação, quando chegavam os sacos lá debaixo). Ah, eu era o Nuno Toalha. Fiquei lá um bom tempo (uns 40 min.). Até que veio uma moça lá de baixo dizendo: “Pessoal, quem não almoçou ainda, vai lá...”; “Ó. Tem almoço aqui?! eu nem sabia!”. Eu tinha programado ficar até 1 hora, depois ia almoçar em casa. Olhei, já era 1 e 40. Topei almoçar lá. Chegando na cozinha, outro time de voluntárias, pareciam aquelas “Mamas Italianas”, sorridentes, e transbordantes de carinho! Aliás, falando em Itália, o almoço era “Macarone ao molho de frango” (que meus amigos vegetarianos me perdoem: comi!! rsss). Tava muito bom. Conversei um pouco e... voltei ao trabalho.
Aí circulei mais um pouco: carreguei cesta básica, fiz placas indicativas de cada coisa, enfim... no final, em poucas horas, meu currículo pessoal encheu: de carregador de saco de brinquedo a encaixotador de macarrão e toalha (em caixas diferente, claro!)

Mas, bom humor a parte, vamos a uma reflexão mais “séria”!
Essa pequena vivência na Cruz Vermelha me mostrou a força que tem uma tragédia para acordar ‘nas pessoas’, ou melhor: em mim, em nós (nós somos ‘as pessoas’!)... aquilo que há de mais humano, verdadeiro e essencial. Alguma parte em nós pode até lamentar: “É... só uma tragédia mesmo para despertar a solidariedade ‘nas pessoas’ ”. É um jeito de olhar. Mas prefiro escrVER outra realidade: nós estamos sendo chamados à ação! Pela dor, sim. Mas “a dor é o grande veículo da consciência”, disse Buda, bem antes de Cristo. É fato que passamos muito tempo dormindo para o essencial – e ainda passaremos – mas estamos despertando. E momentos como esse injetam uma força fora do comum em nós, gerando uma oportunidade para fazermos aquilo que sempre quisemos fazer, mas a preguiça, o consumo, o shopping, a Teveilusão, o Faustão e o Big Brother nunca deixaram...  Preferimos ficar embriagados nos prazeres passageiros que essas coisas nos dão, do que experimentar outros prazeres, mais sutis e verdadeiros, e não menos reais que uma ação Solidária é capaz de fazer. Lembre você, agora, de um momento qualquer em que ajudou alguém. Pode ser até uma velhinha que caiu na rua, ou a lição de casa do seu irmão. Doar é Bom, faz Bem... à saúde, ao corpo, à mente e ao Coração! Experimente você! Aproveite a onda... e comece a surfar nela, deixe te levar mais longe (depois que passarem as emoções dessa tragédia). Cada vez mais seus amigos, vizinhos, seu País, a humanidade, o planeta... vai te convocar a ajudar quem precisa. Comece a exercitar isso. Talvez amanhã seja você que precise. Mas não ajude por isso. Ajude porque é necessário, porque vai fazer bem para a sua humanidade.
As tragédias, todos sabem: já estão acontecendo há tempos e, dizem, vão piorar!
E isso, num primeiro momento, dá medo. O segredo é não parar nele. Saia do lugar comum. O medo é humano, mas é engano também. “Onde há Amor não há Medo”, jamais esqueci isso quando um sábio professor me disse. E Amor, não é teoria, não dá pra explicar nem entender, se aprende Fazendo. “Amar se aprende amando (Drummond)”;  “Amai uns aos outros (Cristo)”,
“Amar é Deusfazer nós, dentro de Nós (Nuno Arcanjo)”...
...sou um poeta estranho, as palavras brincam esquisito em mim, me ensinam coisas incomuns. EscreVENDO, movimento as pessoas... que moram em mim... e elas começam a agir.
Ontem li algo engraçado: “Você quer conhecer Deus? Pra que?! Desista disso! Vais falar o que com ele?: E aí, como vai o senhor? E o tempo... puxa que temporal ontem hein... (Osho)”
Esqueça ‘conhecer Deus’... conheça você! O seu poder!
E pra se conhecer, tem que desligar a Tevê, e até os livros. Tem que fazer!
Já foi o tempo da falação, da teoria.
“Deus não é Teoria, é Ação e Alegria (Nuno)”.
Saibamos, é hora de agir. Mas... como?!
Você sabe! Estenda a mão, de preferência aberta. E se quiser, se conseguir, doe o braço...
e o sangue (literalmente, as vítimas vão agradecer também). Mas se achar muito, comece pequeno, vá no seu vizinho, e inverta um pouco a tradição: “Ei, moro aqui do lado e... você quer uma xícara de açúcar?!” Ele vai rir, sem entender, aí você fala: “Tudo bem, não precisa aceitar, mas... aceita um abraço?!”. Vai rir mais ainda, aí você explica: “Sabe... é pra ajudar as vítimas da tragédia” aí... saiba, em algum lugar, incomum, no meio do peito, ele vai entender. E dá-lhe o abraço! Não importam mais as palavras, amigo, e sim a ação. Foi-se o tempo de justificar as coisas pelas palavras. Vejam os políticos, os economistas, os meteorologistas, se você os está entendendo, acreditando, é porque não está prestando atenção.

Em uma frase: Deus escreve certo por linhas chuvosas!

Por amor... escolha algUMA’Ação, e faça!
(se quiser, me conte, ou não... conte a Deus, ou a si mesmo, é suficiente... boa sorte...

*Nuno Arcanjo é ‘artista-orgânico’,
trabalha com arte e ecologia humana.
Realiza apresentações como ator, músico, poeta,  palhaço e contador de histórias,
além de cursos e oficinas diversas que envolvam arte e consciência.

Entrada da Cruz Vermelha (a "varanda" improvisada, na rua) 

      O Corredor...


Nuno Toalha Arcanjo 

Isabela, 9 anos (a mascote...

    Na cozinha, as "Mamas"...